sábado, 2 de maio de 2009

Foi tudo verdade

A minha mão estava próxima a dela. Minha mão, cansada, repousava sobre um de meus joelhos, o qual estava mais próximo dela. A dela, por sua vez, estava apoiada sobre um de seus joelhos, o qual estava mais próximo de mim. Poderiamos ter nos dado estas mãos, mas preferimos estar um pouco mais livre. O momento necessitava de um pouco de liberdade, até para poder sofrer menos e ter chance de entender melhor. Cada mão portava um cigarro; minha fumaça indo nela, a dela vindo a mim. O calor soprava e eu já sentia que era hora de ir pra casa. Já tinha vivido demais para um dia só. E ela também. No fim da noite, já não havia muito mais o que fazer; as poucas pessoas que ainda restavam por ali passavam longe e voltavam para suas casas, satisfeitos de si e do mundo. Ou quem sabe assim, da mesma forma que nós. Confesso que a preguiça me dominava um tanto - ou eu gosto de sofrer - e permanecemos ali no banco sem coragem de ir viver. Ela também não parecia muito disposta... Podia esbarrar com alguém, sem querer, logo adiante. Esse é o risco. Quando se anda pelas ruas, quando se vai às festas, quando se vai à praia, quando se entra no ônibus, quando se olha pela janela... A pergunta era: e se ele passar? - Ela sentiria aquele mesmo frio; aquela mesma fraqueza nas pernas, o mesmo tremor no coração. Uma manifestação tão grande que ia parecer que tudo permanecia igual a antes. É difícil pra quem sente... Dá vontade de se esconder, as palavras somem, a alma pesa; é como um terremoto submerso dentro de si. E a pergunta seguinte, mais emocional possível, diria: quando vai passar? Quando? Ela também não saberia responder, e eu tão aprendiz quanto, também não conseguia entender tal lógica, nem o sentimento que nos manteve tanto tempo longe da paz - da nossa paz. O que nos faz escravo de um sentimento? Ah, se houvesse ao menos arrependimento. Mas nem há. Tudo valeu a pena, tudo foi tão lindo... Mas acabou; acabou e não deixou nem pista de que existiu. E quando tudo parece mais ou menos sob controle, um simples trocar de olhares de dois "conhecidos" que se cruzam por aí, desestabilizam, destroem o peito. E a gente vê que não foi nem voltou pra lugar algum: o mesmo lugar, o mesmo sentimento. Não, era melhor ficar ali a noite inteira; deveriamos dormir ali e aguardar até o dia nascer, seria mais seguro. Mas ali, naquela escuridão, seria arriscado demais. Nossos pares poderiam estar por aí, e quem sabe até andando juntos. E qualquer motivo seria o da tristeza, de ver que agora estamos sozinhos, que amamos sozinhos. E quem se ama - está feliz; está por aí tão feliz que pode até nos cumprimentar pela rua: como se nada tivesse acontecido. Ah, minha amiga, só a gente sabe... Quem me dera tudo ter sido uma ilusão. A culpa seria nossa e nossa indignação caberia apenas a nós mesmo. Mas não, foi tudo verdade. Cada dia, cada hora, cada instante que não existe mais. Nem há mais nada a ser dito, mas nossa pele respirando nos entrega, desnudos na multidão, que um dia ainda nos resolveremos. E até lá só nos resta chorar... Quem me dera esse conto fosse apenas uma história. Mas não, foi tudo verdade.

2 comentários:

Gabriela Alcântara disse...

foi tudo verdade, verdadeira. quem me dera mesmo que fosse só um conto. obrigada por nos traduzir, amo você.

Unknown disse...

Tudo MUITO lindo.

:D