quinta-feira, 23 de abril de 2009

Dia nacional do choro

Eu já senti isso antes. Tenho certeza que eu já senti isso antes. É uma vontade esquisita do peito se rompendo e os olhos em seguida se enchendo de lágrimas. Mas de costume, alguma coisa aqui dentro - ao passo que quer explodir - enormemente se assusta, se encolhendo. E por fim aprendi a ter os olhos secos; apenas o suficiente para continuarem a enxergar. Mas chorar, não; jamais chorar, ainda mais na frente dos estranhos. Logo mais cedo, eu lia um cartaz no qual estava escrito: Dia 23 de abril - Dia nacional do Choro. Haveria um dia especial para se chorar? Talvez houvesse uma reunião onde todos iriam, calados e tristonhos, cada um no seu assento... chorar. Imagineium grande auditório no qual não se debatiam nem se questionava nada. Na conturbação do mundo, aquele era um momento incrível. Veja só, você poderia chorar e ninguém ia ligar. Você teria um tempo pra sofrer - em paz. Seria fabuloso! Isso porque é normal sorrir, exprimir a felicidade e os desejos que contemplem todo o mundo. Mas quem quer chorar, nem sempre é bem compreendido - apesar de serem justamente aqueles que carecem um pouco mais de compreensão. Ainda mais estando na minha pele: homem. Não, homem não chora. Homem que é homem, não chora, devora todas (isso mesmo, beleza não interessa) as menininhas, fala palavrão, bebe sem passar mal e usa um vocabulário próprio com os companheiros de masculinidade. Alguma pessoa inventou que homem é sempre forte, que não tem medo, que é a coragem personificada e tem sempre a decisão pronta a tomar, bem como a razão para estar certo em aplicá-la. Algum(a) infeliz inventou que homem de verdade é assim. Alguém sugeriu um disparate e a passividade da sociedade aceitou. Contra isso, eu posso até ser, mas não me manifesto mais. O mundo todo é assim, queira bem ou mal. E já que é pra viver, tenho que me acostumar com isso.
Hoje me deu certa tristeza; e o que mais me irritou nela foi a gratuidade e a justificativa muito pouco ou nada aceitável, ainda mais me conhecendo como sou e aceitando os conceitos que eu considero certos. E sou bem assim, gosto do que gosto, penso o que penso, e há muito tempo aprendi a me contentar com esse estado de existir. Confesso que não é fácil. É o extremo oposto. Mesmo estando bem, tem certos momentos que me canso de tanta incoerência. E, na maioria das vezes, isso acaba por me entristecer. Não dá pra agradar todo mundo, eu sei. Mas quando existe o não-gostar gratuito, pelo menos há uma postura neutra ou ao menos educada para tratar alguém de que não se gosta. É claro que já senti isso, mas hajo assim. Não que eu esteja fingindo, até por conta que sou sempre transparente quanto a meus sentimentos. (Coisa aversa aos homens, vale ressaltar). Mas tento ser paciente e compreensivo comigo mesmo e com o outro, para talvez quem sabe mudar de opinião. Opiniões mudam, assim como vontades, necessidades, ideias... E por aí vai. Tudo bem, você não gosta de mim. Não há problema nisso... Mas hoje eu me senti vulnerável e especialmente detestado, porque fui tratado com claro repúdio e desinteresse. Não foi preciso de muito não... Eu simplesmente fui ignorado. Enquanto falava, me interromperam de forma brutal por um assunto qualquer, típico dos que se falam quando o silêncio torna-se mais mortal e tenso. E não foi uma simples interrupção, e sim uma cortada literal... As pessoas têm tato, e até absurdo tanta pretensão agir assim e querer passar despercebido. Tive raiva, tive tristeza... Mas não consegui ser indiferente. Seria o melhor pra mim no momento, como geralmente consigo ser. Mas ser assim também tem um preço. Uma vez eu li que "mais vale a vergonha do que a indiferença". Acho que penso mais ou menos dessa forma. Fazia tempo que não me sentia tão escanteado e minimizado; lembrou-me um pouco da infância, da qual tenho mais recordações ruins que boas. Uma criança "diferente", eu era. O que merece? Passar vergonha. Até valia... Mas indiferença é o pior sentimento que um ser humano é capaz de sentir por outro. É em horas como essa que eu tenho vergonha de ser quem sou. Sei que ser assim tem seu preço. Mas deve ser tão caro assim? E com que moeda eu pago? Qual é o dinheiro da vida? Ainda assim poderia ser bem pior - eu podia ser indiferente comigo mesmo. Quem sabe eu estivesse morto, assim. Mas isso é bom; alguém ainda se importa comigo! Mas não, nunca é fácil.
Cheguei ao auditório... Apresentavam-se músicos homengeando Pixinguinha, grande compositor de choro, que aniversariava nesta data antes de sua morte. Ali só havia alegria ao recordar o músico. Achei até graça da minha imaginação que fora tão longe e imaginara tão além... Me sentei em uma cadeira, apoiando a cabeça na parede. Faltavam só algumas horas para eu ser destratado. Mas isso não queria dizer que eu estaria mais ou menos cansado. Eu só queria chorar... Cada cavaquinho, cada violão vibravam suas cordas chorosas, que emitiam gruninhos musicais que no fundo não eram nada: apenas um choro. Era o pranto de alguém, que de tanto chorar só restara aquele modo de aliviar a dor. Viver doía, e o dia a dia consumia tudo isso e mais eu queria desaparecer. Ah, como seria feliz se eu pudesse chorar... Mas até de esperar isso eu já me cansei. E ainda terei tanto aborrecimento pra me abater, tanta estrada torta pra percorrer e queda pra me reerguer. Depois passa, amanhã já terei outras forças, serei forte. Já chega, por hoje já chega. Se não tenho direito ao choro, me deixem dormir. É o meu modo de escapar.

Um comentário:

Thaíse disse...

Eu me importo, se isso importa! (L)

ah e se quiser chorar comigo, estou aberta e mais que disposta. Posso até te acompanhar. E depois disso estaremos chorados e leves.